BALANÇO MENSAL - JANEIRO

Brasileiros têm o péssimo costume de começar a levar o ano a sério apenas depois do carnaval, mas em se tratando do percurso cinematográfico, meu ano começa no dia 1 de janeiro mesmo. Até porque em 2019 o carnaval só vai acontecer em março, então imaginem que perda de tempo deixar os filmes pra tão longe? 

A exemplo do que aconteceu em 2017, iniciei os trabalhos deste ano com um exemplar da cinematografia italiana, ante ao qual estava cheio de expectativas e que me frustrou. Não é a primeira vez, aliás, que Alice Rohrwacher me deixa quase a ver navios, trazendo uma proposta bem melhor que a execução. No decorrer dos dias, porém, tive bons encontros com outros longas e realizadores, entre os quais destaco Ashgar Farhadi, Jean-Pierre Melville, Lúcia Murat, Hirokazu Kore-eda, Lav Diaz e Curtis Hanson, todos dignos de atenção.

PÓDIO

MEDALHA DE OURO

O círculo vermelho (Jean-Pierre Melville, 1970)


O estilo classudo de Melville não tinha me cativado no primeiro contato com sua filmografia, no superestimado O samurai (Le samöurai, 1967) e, desde então, me tornei resistente a conferir outro filme seu. Até que a curiosidade brotou e decidi dar outra chance, o que se revelou uma decisão bastante acertada. Seu longa sobre um roubo que não transcorre exatamente conforme o planejado é uma sucessão de grandes momentos, em que a técnica e a dramaturgia se harmonizam belamente. Enquanto nos exemplares hollywoodianos a ação corre solta, aqui Melville prefere conduzir tudo com calma, dilatando o tempo e valorizando os silêncios para compor uma narrativa de prevalência imagética. E poucos atores têm a elegância e o fino trato para o protagonismo de seus filmes como Alain Delon, em sua segunda parceria com o realizador.

MEDALHA DE PRATA

Praça Paris (Lúcia Murat, 2017)


O Rio de Janeiro continua lindo, mas... tem mazelas por toda a parte. Cidade na qual convivem a beleza e o caos, fato registrado na canção entoada por Fernanda Abreu, ela é o palco onde transcorre a narrativa de Praça Paris, cujo nome vem do logradouro situado no bairro da Glória, marco inicial da zona sul carioca tomando o Centro como ponto de partida. A dupla central de atrizes ilustra bem alguns dos fortes contrastes socioculturais que coexistem por aqui (sim, é a cidade onde nasci e vivo até hoje). Glória (Grace Passô, extraordinária), cuja vida passa longe de fazer jus ao seu nome, é atendida por Camila (Joana de Verona), psicanalista portuguesa que veio ao Brasil para uma pós-graduação na Universidade Estadual. Os caminhos até então paralelos das duas começam a se entrelaçar de maneira problemática, e é a partir daí que o roteiro da própria diretora em parceria com Raphael Montes revela que um olhar dicotômico é insuficiente para abordar o cotidiano carioca de modo fidedigno.

MEDALHA DE BRONZE

Homem-aranha no aranhaverso (Bob Persichetti, Peter Ramse e Rodney Rothman, 2018)


Um dos méritos dessa animação é o senso de humor bem azeitado, que brinca de cruzar referências e não deixa cair a peteca um só momento. Para espectadores órfãos do Peter Parker de Tobey Maguire, aqui está um alento divertido e inteligente. O trio de diretores satiriza inclusive o fato de o herói ter tido sua história contada desde o começo mais de uma vez, apresentando não somente uma, mas quatro versões do Aranha, uma delas asiática e outra em forma de porco (!!!). Com tamanha inventividade, que inclui a técnica - bem pouco usada -, o longa desbancou as óbvias vitórias consecutivas da Disney/Pixar e abocanhou o Globo de Ouro e o Oscar em sua categoria, demonstrando que existem outras possibilidades de qualidade para o gênero e que faz bem reconhecê-las.

INÉDITOS

1. Feliz como Lazzaro (Alice Rohrwacher, 2018) -> 6.0
2. Todos já sabem (Ashgar Farhadi, 2018) -> 7.5
3. Verdades e mentiras (Orson Welles, 1973) -> 7.5
4. Vazante (Daniela Thomas, 2017) -> 4.0
5. O círculo vermelho (Jean-Pierre Melville, 1970) -> 9.0
6. Sra. Henderson apresenta (Stephen Frears, 2005) -> 7.0
7. A loja mágica de brinquedos (Zach Helm, 2007) -> 7.0


8. Faster, Pussycat! Kill! Kill! (Russ Meyer, 1965) -> 6.0
9. Substitutos (Jonathan Mostow, 2009) -> 3.0
10. Chá com as damas (Roger Michell, 2018) -> 7.0
11. Cavalgada dos proscritos (Walter Hill, 1980) -> 8.0
12. O casamento de Muriel (P. J. Hogan, 1994) -> 7.0
13. Larry Crowne - O amor está de volta (Tom Hanks, 2011) -> 4.0


14. Praça Paris (Lúcia Murat, 2017) -> 8.0
15. A esposa (Björn Runge, 2017) -> 7.0
16. Assunto de família (Hirokazu Kore-eda, 2018) -> 7.5
17. MIB - Homens de preto (Barry Sonnenfeld, 1997) -> 6.0
18. Vida selvagem (Paul Dano, 2018) -> 7.0
19. Assim caminha a humanidade (George Stevens, 1956) -> 7.0
20. Minha vida em Marte (Susana Garcia, 2018) -> 7.0


21. A negociação (Nicholas Jarecki, 2012) -> 7.0
22. A mulher que se foi (Lav Diaz, 2016) -> 7.5
23. Em seu lugar (Curtis Hanson, 2005) -> 7.5
24. Impacto fulminante (Clint Eastwood, 1983) -> 7.0
25. Half Nelson (Ryan Fleck, 2006) -> 5.0
26. Homem-aranha no aranhaverso (Bob Persichetti, Peter Ramse e Rodney Rothman, 2018)
27. Mata Hari (George Fitzmaurice, 1931) -> 7.5


28. O velho e a arma (David Lowery, 2018) -> 6.5
29. Não aceitamos devoluções (Eugenio Derbez, 2013) -> 6.0
30. Nasce uma estrela (Bradley Cooper, 2018) -> 7.0
31. Querido menino (Felix Van Groeningen, 2018) -> 7.5
32. 10 coisas que eu odeio em você (Gil Junger, 1999) -> 7.0
33. Suspiria (Luca Guadagnino, 2018) -> 2.0


34. Levada da breca (Howard Hawks, 1938) -> 8.0
35. O rito (Ingmar Bergman, 1969) -> 7.5
36. O cozinheiro, o ladrão, sua mulher e o amante (Peter Greenaway, 1989) -> 7.5
37. Green book - O guia (Peter Farrelly, 2018) -> 6.5

REVISTOS

Moulin Rouge - Amor em vermelho (Baz Luhrmann, 2001) -> 8.0
A última noite (Spike Lee, 2002) -> 8.0
Guerreiro (Gavin O'Connor, 2011) -> 8.0
Magia ao luar (Woody Allen, 2014) -> 7.5
O túmulo dos vagalumes (Isao Takahata, 1988) -> 10.0

MELHOR FILME: O círculo vermelho
PIOR FILME: Suspiria
MELHOR DIRETOR: Jean-Pierre Melville, por O círculo vermelho
MELHOR ATRIZ: Grace Passô, por Praça Paris
MELHOR ATOR: Jake Gylenhaal, por Vida selvagem
MELHOR ATRIZ COADJUVANTE: Tilda Swinton, por Suspiria
MELHOR ATOR COADJUVANTE: Ricardo Darín, por Todos já sabem
MELHOR ROTEIRO ORIGINAL: O círculo vermelho
MELHOR ROTEIRO ADAPTADO: A mulher que se foi
MELHOR FOTOGRAFIA: O círculo vermelho
MELHOR TRILHA SONORA: O círculo vermelho
MELHOR FINAL: O círculo vermelho

Comentários

Postagens mais visitadas