BALANÇO MENSAL - SETEMBRO

Mais um mês se passou, mas um balanço chegou. Em setembro, vi um pouco menos de filmes que em agosto, meu melhor mês cinematográfico de 2013 até agora. Felizmente, foram poucas as notas baixas, e mais um 10 surgiu quase no finzinho. A palavra, maravilha dirigida por Carl Theodor Dryer, fez por merecer a maior nota de setembro, com sua trama sobre a milenar alternância humana entre fé e dúvida. Logo atrás, com um belo 9, vem Nebraska, mais um road movie de Alexander Payne, que acerta ainda mais do que em seu trabalho anterior.

Entre os piores, ficaram o brasileiro Cafuné, de Bruno Viana, que flerta de modo desagradável com a chanchada e apresenta um resultado artesanal demais, por assim dizer. Assim como ele, o mexicano Heli, que recebeu o prêmio de melhor direção no último Festival de Cannes, sucumbe a uma pretensão sociológica que dilui boa parte do seu impacto. 

A seguir, os 32 filmes do mês com breves comentários e os melhores nas categorias principais - as que julgo importantes, pelo menos:

LONGAS:

1. Rubber (2010) - Exclamação elevada ao cubo. Nota: 8.0

2. O despertar de uma paixão (2006) - Belíssimo folhetim melodramático - seria isso um pleonasmo? - com pitadas políticas situado na umidade da China interiorana e executado em planos estonteantes e atuações afiadas. Pena ter ganhado um título nacional tão reducionista. Nota: 8.0

Festim diabólico (1948)
3. Festim diabólico (1948) - Suspense e cinismo bem dosados até um final um tanto desestimulante, mas que não tira uma centelha sequer do brilho desta obra sobre o prazer de assassinar. A ambiguidade também marca presença nessa festa. Nota: 8.0 

4. Cafuné (2005) - A famigerada tensão entre morro e asfalto em pinceladas quase caricaturais. O começo e o fim abruptos são entremeados por cenas banais e atores um tanto chanchadescos, no sentido pejorativo do termo. Nota: 5.0

5. Rush - No limite da emoção (2013) - Uma longa e acirrada disputa pelas estradas sinuosas da vida entre adversários que se conheciam muito bem, apesar da distância. Novamente com Morgan no roteiro, Howard entrega mais um belo filme em que não sucumbe à tentação da dicotomia estrita. Nota: 8.0

6. Barbara (2012) - Petzold trabalha no limite da sobriedade, trazendo uma protagonista de emoções discretas e diligência ameaçada por afetos inesperados. Nota: 7.0

7. Palermo shooting (2008) - Wenders revisita a metafísica oferecendo mais da sua monotonia hipnótica. Nota: 8.0

8. Minha mãe é uma peça - O filme (2013) - Mãe é tudo igual, só muda o endereço. Mãe, só tem uma. Mãe é mãe! Nota: 7.0
Oblivion (2013)

9. Oblivion (2013) - O roteiro confuso é a grande pedra de tropeço desta ficção morna e genérica, que desperdiça orçamento e o tempo do espectador em sequências explosivas. Nota: 5.0

10. Elysium (2013) - Pipocão de alta qualidade, bem servido de elenco, roteiro e montagem. Mais uma vez, Blomkamp enxerga um futuro desolador e injeta doses de crítica social em meio à ação bem orquestrada. Nota: 8.0

11. Possuídos (2006) - Altamente perturbador e literalmente incendiário, desafia a sanidade de seu público em passagens tensas, longas e arduamente interpretadas. Nota: 8.5

12. Noite de estreia (1977) - Os fantasmas de uma atriz envoltos em uma atmosfera sufocante, resultando em um filme de digestão lenta. Rowlands está indescritível. Nota: 7.5

13. Noites de lua cheia (1984) - Os velhos acasos e indecisões do coração visitados com o traço inconfundível de Rohmer. Seu rigor formal, outra vez, mostra-se adorável. Nota: 8.0

14. A conquista da honra (2006) - A guerra transforma os homens em baús de memórias doloridas. E há quem insista em transformar essa realidade atroz em espetáculo midiático. Boa reflexão sobre cicatrizes da vida, apesar dos excessos narrativos. Nota: 6.5

15. O selvagem da motocicleta (1983) - Um protagonista com a corda no pescoço e um punhado de situações desinteressantes. Sobressaem-se a fotografia em preto e branco e a curiosidade em ver Dillon, Rourke e Cage tão jovens e tão bons. Nota: 6.0
Eu te amo, cara (2009)

16. Eu te amo, cara (2009) - É como diz o slogan: "Você é o homem o bastante para dizer isso?". Adorável comédia sobre o quanto a amizade vale a pena sem qualquer reserva. Nota: 7.5

17. Dois irmãos (2010) - De novo, Burman bate na trave ao abordar os ônus e bônus das relações familiares, oferecendo uma ou outra cena digna de nota. Os protagonistas, no entanto, estão formidáveis do início ao fim. Nota: 6.5

18. Os amantes do círculo polar (1998) - Medem abre uma fenda no tempo e espia os descaminhos de dois apaixonados errantes cujos perfis não cativam. Poderia ser bem mais do que é. Nota: 6.0

19. Amor bandido (2012) - As pontas da história são bem alinhavadas e, mesmo que o esquema geral seja um tanto previsível, o elenco demonstra capacidade para envolver. Mais uma prova de que McConaughey faz um bom trabalho com um papel digno nas mãos. Nota: 8.0

20. Dose dupla (2013) - Tiros, trapaças, uma explosão aqui, outra acolá, nada de papas na língua e dois atores em ponto de bala: o passatempo está garantido. Nota: 7.0

21. Ed Wood (1994) - O carinho pelos tipos excêntricos que desfilam na tela, a começar pelo próprio Wood, é o toque de Midas dessa história praticamente irretocável.

22. God bless America (2011) - Implode a correção política e atira para todos os lados, literalmente. O caminho escolhido para achincalhar os "valores" estadunidenses é tão deletério quanto esses próprios "valores", mas o que se sobressai é o humor negro. Nota: 8.0

23. Heli (2013) - A insistente ambição sociológica do diretor conduz o filme à vala comum de produções que entregam um recorte do real pontuado por silêncios que mascaram uma incapacidade de dizer. Nota: 5.0

24. The kings of summer (2013) - Porque, diante de uma grande e forte amizade, certas picuinhas ficam pequenas demais... Nota: 7.0
Cartas de Iwo Jima (2006)

25. Cartas de Iwo Jima (2006) - Tautológica, a expressão "tragédia bélica dolorida" sintetiza bem o espírito deste filme. Antes de tudo, há homens com páginas de história pré-escritas que se lançam no abismo escuro do combate. Nota: 8.0

26. Sindicato de ladrões (1954) - Excelente direção de atores e roteiro esmerado: duas das principais qualidades de um filme que não ficou datado e diz muito sobre o quanto, cedo ou tarde, as consequências batem à porta. Nota: 8.0

27. Trono manchado de sangue (1957) - Ilustra com propriedade o ditado segundo o qual "quanto maior a altura, maior o tombo". Toshirô Mifune faz misérias como o obstinado Washizu. Nota: 8.0

28. Bastardos (2013) - Um quebra-cabeça a ser montado com paciência e alguma dose de contemplação. Rigorosamente encenado, reúne e dosa bem drama e suspense.

29. Nebraska (2013) - Percorre um terreno agridoce e comovente de histórias e momentos comuns a qualquer pessoa. Um autêntico road movie em P&B que traz Squibb como uma ladra de cenas impagável. Nota: 9.0
A palavra (1955)

30. A palavra (1955) - Em tempos tão apóstatas, céticos, agnósticos e ateus, há que se lembrar a necessidade da fé, por meio da qual uma palavra traz à tona o que não existe. Conhecer a Deus, afinal, é um ato de fé. Nota: 10.0

31. Quando a noite cai em Bucareste ou metabolismo (2013) - Lentíssimo, para ser digerido com toda a calma do mundo. Reafirma o interesse de Porumboiu pelo mundo que criamos com a palavra.

32. Um estranho no lago (2013) - Caminha para um desfecho de ares hitchcockianos. Até lá, investe no confinamento da paisagem-título alternando crueza, solidão e apego. Nota: 8.0

33. Frankenweenie (2012) - Burton em boa forma cruzando referências e atentando para o carinho com os animais, todos adoravelmente esquisitos, como de hábito em seu mundo cinematográfico. Nota: 7.0

CURTAS:

Vessel (2012) - Um pingo de tensão espargido em alguns minutos de uma trama rasteira que nem prega sustos (a rima infeliz é proposital). Nota: 4.0

Motorville (2013) - Simpática inventividade e indireta para bons entendedores. Nota: 8.0

Recife frio (2009) - Temática e formato inusitados para a construção de um enredo de contornos plausíveis e o reconhecível traço autoral de um realizador atento aos matizes sociais de seu lugar.

MELHOR FILME: A palavra
PIOR FILME: Cafuné
MELHOR DIRETOR: Carl Theodor Dryer, por A palavra
MELHOR ATRIZ: Gena Rowlands, por Noite de estreia
MELHOR ATOR: Bruce Dern, por Nebraska
MELHOR ATRIZ COADJUVANTE: June Squibb, por Nebraska
MELHOR ATOR COADJUVANTE: Martin Landau, por Ed Wood
MELHOR ROTEIRO ORIGINAL: Rudolph Grey e Scott Alexander, por Ed Wood
MELHO ROTEIRO ADAPTADO: Kaj Munk e Carl Theodor Dryer, por A palavra
MELHOR TRILHA SONORA: Stuart Staples, por Bastardos
MELHOR FOTOGRAFIA: Claire Mathon, por Um estranho no lago
MELHOR DIREÇÃO DE ARTE: Nancy Anna Brown, Ross Dempster, Don Macaulay e Hania Robledo, por Elysium
MELHOR CENA: O crime no lago de Um estranho no lago
MELHOR FINAL: Nebraska

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