MELHORES DO CINEMA EM 2017: FILMES E DIRETORES

A poucos dias do fim de mais um ano, chegam minhas listas de melhores do cinema, a exemplo de vários outros amigos apaixonados por essa arte. Sem a pretensão de oferecer uma relação definitiva, mesmo porque não assisti a todos os filmes que desejava, reuni nessa primeira de três partes de seleções os meus preferidos entre títulos e realizadores, sendo 15 para aqueles e 5 para estes. Reforço, também como todos os anos, minha falta de preocupação em montar listas segundo o grau de preferência, e este ano adotei o critério da ordem alfabética (desconsiderando os artigos), diferentemente de outras edições, em que tinha recorrido à ordem de lançamento nos cinemas. Portanto, não cabem comentários do tipo "eu colocaria X em outra posição" ou "Y deveria estar mais acima ou abaixo".

Diferentemente dos anos anteriores, essa lista não contém nenhum filme nota 10, fato que lamento, porque sei que ainda é possível realizar produções de franca excelência, mas 2017 se mostrou um ano relativamente difícil para se alcançar a cotação máxima. Por isso, alguns títulos foram incluídos com ressalvas, mas as qualidades prevaleceram. A maior nota foi 9, e somente cinco diretores fizeram por merecê-la: Ken Loach, Kenneth Lonergan, François Ozon, Woody Allen e Aki Kaurismäki. As razões são apontadas nos pequenos parágrafos que redigi para cada, e três deles na verdade são trechos das críticas feitas para cada filme deles. Outro reforço importante: foram considerados para essa seleção apenas os filmes lançados oficialmente em circuito comercial, seja no Rio de Janeiro, minha cidade natal e de habitação, seja em outro local do Brasil. Assim, filmes rodados esse ano, mas sem exibição nos cinemas ficaram de fora, podendo aparecer na lista de 2018, caso sejam lançados.

1. Atômica (David Leitch)



A despeito de seu excesso de nomes e relações intricadas entre personagens, é gostoso acompanhar Charlize Theron linda, loura e fatal sob a pele de uma charmosa agente cujas imensas habilidades física e intelectual fazem que ela transite por mundos diferentes sem perder a boa forma. Muitos apontam como uma versão feminina de John Wick, e não é absurdo pensar num parentesco entre os filmes, embora Atômica exiba uma mescla de conspirações nebulosas e pancadarias, estas últimas impressionantemente coreografadas.

2. Bom comportamento (Benny e Josh Safdie)



Parece que a dupla de cineastas quis trazer ao público uma representação audiovisual da célebre lei de Murphy: o que pode dar errado vai dar errado. Construído em um ritmo de frenético, de poucas concessões para respirar, o longa coloca Robert Pattinson dando vida a um jovem que se mete em desventuras em série para tentar livrar a cara do irmão, que acabou sendo preso depois que um assalto praticado por eles foi descoberto pela polícia. A comparação aqui foi com Depois de horas - meu Scorsese preferido, diga-se de passagem - e dessa vez houve um certo exagero, mas Bom comportamento também funciona como diversão agoniante.

3. O dia mais feliz da vida de Olli Mäki (Juho Kuosmanen)



Escrevi um textinho sobre o filme para o balanço de abril, no qual ele ocupou o primeiro lugar do pódio, e segue aqui um trecho: "A narrativa desse representante da Finlândia para uma vaga entre os finalistas ao Oscar de melhor filme estrangeiro acompanha em alguns dias a rotina de um padeiro levado à posição de ídolo nacional. Tudo por causa de grande talento no boxe. O real interesse do realizador é mergulhar na humanidade de Olli Mäki, então o ringue é presença escassa na história. No título reside um misto de ironia com uma ida na contramão das hipóteses. 

4. Eu, Daniel Blake (Ken Loach)



Em 2016, Ken Loach passou a formar com  Michael Haneke, Jean-Pierre e Luc Dardenne o quarteto dos diretores premiados duas vezes com a Palma de Ouro em Cannes. Sua segunda láurea veio com uma história de resistência, que expõe a burocracia nefasta do governo inglês, não devendo em nada ao Brasil nesse quesito. O protagonista passa a depender de um auxílio doença enquanto se recupera de uma ataque cardíaco, mas chegar a recebê-lo se torna um périplo, e no pedregoso caminho ele conhece uma mãe solteira também vivendo circunstâncias nada fáceis. O queridinho da Croisette acertou de novo e deu um irmão mais velho para Clara, a estrela de Aquarius: os dois resistem apesar de tudo. 

5. Frantz (François Ozon



Escrevi um textinho sobre o filme para o balanço de abril, no qual ele ocupou o primeiro lugar do pódio, e segue aqui um trecho: "Retrocedendo quase 100 anos no nosso calendário, sua narrativa acompanha um jovem ex-soldado francês da Primeira Guerra Mundial corroído pela culpa de ter atirado - e assassinado - um inimigo alemão. [...] Tudo é conduzido com imensa elegância por Ozon, que elegeu o preto e branco para filmar quase todas as cenas, somente quatro delas ganham cores e um significado ainda mais forte no contexto da narrativa.

6. La la land - Cantando estações (Damien Chezelle



Homenagem e citação é o que não falta em La la land. E a mais notável paráfrase do longa, sem dúvida, é a Os guarda-chuvas do amor (Les parapluies de Cherbourg, 1964), clássico cinquentão de Jacques Demy sobre um casal e seu relacionamento atravessado pelas estações. A estrutura adotada por Chezelle é análoga àquele, evidenciando a beleza de um diálogo com uma geração que até hoje ecoa no próprio e cinema e deixa saudade em muitos pelo seu modus vivendi. [crítica completa]

7. Logan (James Mangold)



A humanidade do herói está exposta, a começar pela presença de seu "nome social" no título. O célebre Wolverine, com suas garras de aço sempre disponíveis, enfrenta a decrepitude e ganha uma companheira que está só começando sua viagem. Sobram desencanto e emoção nesta que é a despedida de um personagem icônico, Logan também transpira aventura e combate, mesmo com seu protagonista envolto em temores, no melhor exemplo de "quem te viu, quem te vê".

8. Manchester à beira-mar (Kenneth Lonergan)



Cada pessoa é uma soma de acontecimentos, e a narrativa de Manchester à beira-mar reafirma essa concepção com sensibilidade, evitando incorrer no dramalhão pesado. Lonergan exercita seu lado cineasta apenas pela terceira vez, com planos encantadores que mostram Lee como um cara que já teve motivos para sorrir e navegava frequentemente com Joe, o irmão, e Patrick, o sobrinho. Eram momentos ternos e divertidos e Joe adorava contar piadas de tubarão, lembranças que vão e vêm da mente de Lee após seu retorno a Manchester. [crítica completa]

9. Na praia à noite sozinha (Hong Sang-soo)


Pelo segundo ano consecutivo, tem Sang-soo na lista de melhores do ano. O sul-coreano emenda um filme no outro, conseguindo ser mais "produtivo" (estranho usar essa palavra para falar de arte, daí as aspas) que Woody Allen: este ano foram dois longas, um deles rodado na surdina com Isabelle Huppert. Mas o escolhido foi este, em que segue no uso da metalinguagem para acompanhar uma mulher desiludida e abraça uma estética da sinceridade um tanto inesperada para o mundo oriental na concepção basal do lado de cá.

10. O outro lado da esperança (Aki Kaurismäki)




Parte de mais uma trilogia iniciada com O porto (Le Havre, 2011), O outro lado da esperança (Toivon tuolla puolen, 2017) também é um olhar do finlandês para a urgente questão imigratória, que tanto convulsiona a Europa e levanta a poeira da xenofobia e do racismo, só para ficar em duas reações adversas entre os nativos do continente. E, novamente, ele focaliza as exceções ao que parece a regra não somente lá, mas em outras partes. Não sem um toque de nonsense, é bom que se diga, e aí está umas das delícias do modus operandi kaurismäkiano. 

11. Paterson (Jim Jarmusch)



A impressão que Jarmusch deixa com seus filmes é a de que vive de boa, sem grandes arroubos, e observa detalhes banais da vida com lente de aumento. Sob um certo ponto de vista, Paterson é mais um de seus filmes sobre o "nada", e essa concepção se reforça em nossos dias, tão velozes que nos roubam a capacidade de cultivar "olhos de ver", aqueles que são capazes de perceber que existe poesia até mesmo em uma caixa de fósforos e apreciar a companhia de um cãozinho adorável. A missão de encarnar esse poeta que vê onde não veem foi muito bem cumprida por Adam Driver.

12. Roda gigante (Woody Allen)



O mesmo filme e, ainda assim, um filme diferente. A façanha anual de Allen se cumpriu novamente, e seu encontro com ninguém menos do que Kate Winslet nos leva para os anos 50 em Coney Island para encontrar uma mulher amarga, cujo erro do passado ainda atormenta e o casamento atual não satisfaz. Um romance com um salva-vidas parece uma tábua de salvação (conceito que é uma das recorrências do diretor) e um novo erro vem para desarranjar o estado das coisas. Tudo isso com luzes impressionantes, trabalho do esteta Vittorio Storaro. 

13.  Star wars episódio VIII - Os últimos Jedi (Rian Johnson)



Foram dois anos de espera até o reencontro com figuras carismáticas e queridas em duas aventuras galácticas no ano em que o quarto episódio completou quarenta anos. E foi o encontro com mais um herói vulnerável: Luke Skywalker assume suas fraquezas e se revela um mito desconstruído, com um erro pelo qual se culpa, mas uma aparição muito especial o faz rever sua postura. Tentativas e erros de outros heróis também surgem, mostrando que sempre há muito a aprender. E os comentários acabam aqui!

14. Toni Erdmann (Maren Ade)


Este foi um dos queridinhos do 69º Festival de Cannes, de onde saiu com o prêmio da crítica. Exibido num dos primeiros dias, repercutiu ao longo de toda a mostra e mesmo sua longa duração não chega a tornar a narrativa enfadonha, como de outros filmes que erram a mão na prolixidade e não justificam mais de 120 minutos. Por investir em momentos cômicos que aliviam o peso da relação tumultuada entre Winfried e Ines, a produção também ajuda a "combater" o mito de que alemães não são bem-humorados ou avessos a ironias. [crítica completa]

15. Z - A cidade perdida (James Gray)


Não é exatamente a temática que se espera de um diretor de seu calibre, mais afeito a retratos urbanos pintados com certo intimismo, especialmente sua obra-prima, Amantes (Two lovers, 2008). O filme em análise está mais para um Werner Herzog, realizador de Aguirre, a cólera dos deuses (Der Zorn Gottes, 1972) e Fitzcarraldo (idem, 1972), cujos enredos se desdobram em aventuras megalomaníacas. Os pés atrás, contudo, ficaram no passado logo nos primeiros minutos de sessão de mais um Gray, que demonstra manter um elo coesivo com sua obra pregressa, e são detalhes aqui e e ali a sedimentar essa observação. [crítica completa]


DIRETORES

Aki Kaurismäki (O outro lado da esperança)
Barry Jenkins (Moonlight - Sob a luz do luar
James Gray (Z - A cidade perdida)   
Kenneth Lonergan (Manchester à beira-mar)
Woody Allen (Roda gigante)


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