BALANÇO MENSAL - OUTUBRO

Vamos direto ao ponto: o mês de outubro veio com mais uma nota 10, destinada para o italiano A grande beleza, retorno de Paolo Sorrentino à sua terra natal depois de uma passagem por Hollywood. Emulando Fellini, o diretor passeia por cores, sons, hábitos e ideologias de uma Itália contemporânea, fazendo valer cada minuto diante da tela. Outubro também trouxe algumas bombas, como o patético Os encontros da meia-noite, estreia na direção de Yann Gonzalez, cujo ímpeto de gerar inquietação deixa tudo com gosto muito duvidoso. Fazendo companhia a esse desastre, estão Aposta máxima, coletânea de erros assinada por Brad Furman, e Obsessão, novo de Lee Daniels que tem Nicole Kidman e John Cusack em desempenhos constrangedores.

A seguir, a relação completa dos filmes vistos em outubro com notas e breves impressões:

LONGAS:
1. O passo suspenso da cegonha (1991) - Sob os escombros de uma vida, existem muitas histórias guardadas. Angelopoulos é o cineasta dos planos grandiosos musicados por acordes enternecedores. 8.0

Blue Jasmine (2013)
2. Blue Jasmine (2013) - Os anos passam e Allen continua afiadíssimo, unindo comédia e toques corrosivos de um jeito só seu. Blanchett e Hawkins estão fantásticas. 9.0 

3. Gravidade (2013) - Tensão sideral. 9.0

4. A garota de lugar nenhum (2012) - Uma porta se abre: entra o desconhecido, que não traz consigo todas as respostas. Crer e criar se confundem no olhar de Brisseau. 8.0

5. Suspensão da realidade (2012) - Sufocante, estiloso e sagaz, invoca David Lynch com seu mistério de toques oníricos. Vários achados se espalham pela narrativa intrincada. 8.0

6. Os encontros da meia-noite (2013) - Tremenda piada de mau gosto sobre as variantes do prazer combinada a um existencialismo grotesco. Do mesmo naipe de um Dolan da vida. 3.0

O imigrante (2013)
7. O imigrante (2013) - Gray segue filmando à moda antiga e oferece mais uma tragédia cinzenta à sua carreira. Com poucas reviravoltas, discorre sobre o perdão e o amor ao recomeço. 8.5 

8. A gatinha esquisita (2013) - "- Elefante rosa quer voar". "Espera, tenho que alimentar as galinhas primeiro". 7.0

9. Backwater (2013) - Com pouco a dizer, o cineasta escorrega em algumas redundâncias. Ainda assim, desperta interesse por observar o estado de confusão de um jovem lidando com a urgência do crescimento. 7.0

10. Fading gigolo (2013) - Turturro embebido em influências allenianas, a começar pelo próprio Allen marcando presença em cena. Uma delícia de comédia à qual não faltam boas tiradas e carisma. 8.0

11. The canyons (2013) - Sexo e decadência na Hollywood contemporânea, terra do hedonismo a qualquer preço e da beleza opaca. Em seu conjunto, um filme genérico e de elenco mediano. 7.0

Serra Pelada (2013)
12. Serra Pelada (2013) - Ouro de tolos. 7.5 

13. Apenas Deus perdoa (2013) - Refn expõe a violência com desconcertante placidez e silencia seus personagens a maior parte do tempo em prol da imagem. Toda a trama, em rotação vagarosa, poderia ter sido resolvida em um média-metragem. 7.0

14. A grande beleza (2013) - Quando uso o termo "filmaço", é a um desses que estou me referindo. Sorrentino genializando. 10.0

15. Frances Ha (2012) - Um filme que é a sua protagonista: irritante, carinhoso, desengonçado e síntese de uma geração que ainda não se adaptou ao mundo de escolhas que é a vida. 7.0

16. Only lovers left alive (2013) - Jarmusch velho de guerra, com toda a tranquilidade para desfiar suas idiossincrasias e brincar com um punhado de referências, alternando momentos de tédio e diversão de seus personagens seculares. 8.0

17. Atriz milenar (2001) - Um mergulho em um universo complexo de memórias e sobreposições temporais que contam uma história forte e marcante. Realidade e ilusão voltam a se confundir e pedem muita atenção ao jogo cênico arquitetado na mente criativa de Kon. 8.5

O clã das adagas voadoras (2004)
18. O clã das adagas voadoras (2004) - Esbanja apuro visual e abre espaço a certos ingredientes novelescos um tanto desabonadores. As surreais cenas de batalha enchem os olhos. 7.0

19. Ato final (1971) - O ato final é de arrepiar. 9.0

20. Terra firme (2011) - Uma Itália para além dos cartões-postais e a arte imitando a vida. Como Aki Kaurismaki, Crialese discute o desconforto europeu com a imigração ilegal africana. 7.0

21. Os suspeitos (2013) - Bem arquitetado narrativamente, traz reviravoltas críveis e uma escalação de elenco acertada, sobretudo Gylenhaal e Leo, os mais exigidos pelo roteiro. A fotografia cinzenta de Roger Deakins é outro ponto positivo. 8.0

22. Cléo de 5 às 7 (1962) - A poesia singela do quotidiano, o gesto apaixonado, o carinho sincero, a beleza de Corinne Marchand. 8.0

23. Machete (2010) - É Rodriguez botando pra quebrar e entretendo com a sua violência cartunesca. 8.0

24. A hora mais escura (2012) - Busca na realidade a matéria-prima para um filme em que paranoia, obsessão e arrogância caminham lado a lado em um vaivém exaustivo. Chastain está bem, mas a indicação ao Oscar foi um exagero. 5.0

Passion (2012)
25. Passion (2012) - Um labirinto de emoções construído com requinte e elegância. A cada novo desdobramento, uma surpresa resfolegante. 9.0 

26. Contos da noite (2011) - Variações de histórias de coragem em tempos diversos e um traço minimalista encantador. Dialoga com crianças e adultos e evoca o poder criador do Cinema. Lindíssimo exemplar de animação. 9.0

27. Aposta máxima (2013) - Uma bomba, senhores. O roteiro é banal e com ironias para otários, a canastrice reina, as escolhas estéticas são pífias, entre outros elementos que o desqualificam mesmo como passatempo. 4.0

28. Roma, cidade aberta (1945) - Um filme emblemático que, apesar do ritmo irregular, oferece passagens de reflexão oportuna. Rossellini foi corajoso ao revolver uma ferida ainda tão recente à época. 7.0

29. Obsessão (2012) - A começar pela direção desleixada, é um desastre em várias frentes. Sobram momentos constrangedores e uma pretensão de causar impacto. Como se não bastasse, Kidman e Cusack estão caricaturais. 4.0

30. Pagando bem, que mal tem? (2008) - A rima do título nacional é podre, mas até que o filme em si traz momentos divertidos. Smith gosta de unir sarcasmo e coração e a receita, longe de ser original, vale o tempo diante da tela. 6.5

31. Le passé (2013) - Tão somente os conflitos humanos, os acúmulos de uma vida, os interiores desnudados suavemente e os muitos pontos de vista sobre um mesmo estado de coisas. 8.5

32. Harakiri (1962) - Um épico intimista de força descomunal. 9.0
O castelo de Cagliostro (1979)

33. O castelo de Cagliostro (1979) - Emoção e aventura no melhor estilo Miyazaki. Partindo de uma premissa clássica, a narrativa envolve com magia deliciosa e torcer pelos personagens é quase inevitável. 8.0

34. Os cowboys de Leningrado vão para a América (1989) - Com seus topetes inacreditáveis, esses caubóis promovem o casamento entre o irônico e o surreal e esbanjam carisma desastrado. Comédia das ótimas! 9.0

35. Invocação do mal (2013) - Horror genuíno: atmosfera sufocante, noites traiçoeiras, sobressalto, simbolismos e muitos sustos. O mal existe e continua agindo, como sintetiza a frase final de Ed, que aproxima Cinema e realidade (e que baita edição de som...). 8.5

36. Laços de ternura (1983) - No quesito interpretações, o público está muito bem servido, inclusive pelas crianças. Quanto ao roteiro, um pouco menos de melancolia e prolixidade teria caído melhor, e é uma pena que Brooks tenha vencido Bergman naquele ano. 7.0

37. Irma Vep (1996) - Cinema como arte ou como indústria? A instigante discussão é entrecortada pelos bastidores tumultuados do filme dentro do filme e costurada por toques de ironia. Algumas escolhas, porém, ofuscam o que poderia ter mais brilho. 7.5

38. É o fim (2013) - Sem se levar a sério um minuto sequer, detona um arsenal de piadas e referências que não livram a cara de nenhum dos envolvidos no projeto. O escracho e a escatologia também foram convidados para a reunião. 7.0

39. O capital (2012) - As mentiras que o capitalismo conta. 8.0

CURTAS: 

Cavalette (1991) - Milhares de anos de História em traços simples e diretos. Piscou, perdeu a alusão. 7.5

Squamata (2012) - Ideia simpática e realizada com minimalismo. Nada que vá mudar a vida, mas um caso a se pensar. 7.0

O conde gostou da coisa (1970) - Puro devaneio amador. 6.0

O grande roubo do trem (1903) - Em 1903, andar de trem era um perigo com esse quarteto à solta por aí! 8.0

Junkopia (1981) - A estranheza visitando o cotidiano e chamando a atenção por seu mistério. 7.0

O pequeno caos (1966) - O 'enfant terrible' Fassbinder abre-alas para o Kubrick de 'Laranja mecânica' e partilha de algumas diretrizes da Nouvelle Vague cheio de marra. 8.0

MELHOR FILME: A grande beleza
PIOR FILME: Os encontros da meia-noite
MELHOR DIRETOR: Paolo Sorrentino, por A grande beleza
MELHOR ATRIZ: Cate Blanchett, por Blue Jasmine
MELHOR ATRIZ COADJUVANTE: Sally Hawkins, por Blue Jasmine
MELHOR ATOR: Toni Servillo, por A grande beleza
MELHOR ATOR COADJUVANTE: Jake Gylenhaal, por Os suspeitos
MELHOR ROTEIRO ORIGINAL: Woody Allen, por Blue Jasmine
MELHOR FOTOGRAFIA: Emmanuel Lubeski, por Gravidade
MELHOR TRILHA SONORA: Brian Copenhagen, por Blue Jasmine
MELHOR CENA: O plano de abertura de Gravidade
MELHOR FINAL: Only lovers left alive
MENÇÕES HONROSAS: Blue Jasmine, Gravidade, Contos da noite, Ato final, Passion

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